A história de Belo Horizonte que não aparece nos livros de escola

Descubra a história de Belo Horizonte que não aparece nos livros escolares e compreenda como a capital mineira guarda memórias surpreendentes

Escrito por:
Igor Souza

Publicado em:
01/10/2025

Quando se fala em Belo Horizonte, muitos lembram da Pampulha, da Praça da Liberdade ou do Mercado Central. Mas a capital de Minas Gerais guarda episódios pouco comentados que não chegam aos manuais escolares. São memórias que envolvem o antigo Curral del-Rei, as remoções para erguer a nova capital e as contradições de um projeto urbano ousado.

  • O passado do Curral del-Rei ainda ecoa na identidade da cidade.

  • O plano urbanístico de Aarão Reis transformou o território em capital planejada.

  • A memória popular preserva aspectos que os livros oficiais quase não relatam.

Por que a história de BH vai além da versão oficial?

A narrativa escolar sobre Belo Horizonte costuma ser resumida: a cidade planejada que substituiu Ouro Preto como capital em 1897. Essa versão, embora verdadeira, simplifica um processo complexo que envolveu disputas políticas, deslocamentos sociais e a tentativa de criar uma metrópole moderna em pleno interior de Minas Gerais.

Conhecer essa dimensão esquecida é compreender que BH não nasceu apenas de mapas e decretos. Sua história foi marcada por escolhas que afetaram milhares de pessoas e que moldaram a identidade da cidade até hoje.

O que aconteceu com o Curral del-Rei?

Antes da construção da nova capital, a região era ocupada por um arraial chamado Curral del-Rei. Ali viviam famílias que cultivavam lavouras, criavam gado e mantinham tradições religiosas. Com a decisão de erguer Belo Horizonte, o arraial foi demolido quase por completo, e seus moradores foram transferidos para áreas mais afastadas, como Venda Nova.

Esse episódio raramente aparece em destaque nos livros escolares, mas é essencial para entender a ruptura social provocada pela urbanização. As casas de pau a pique deram lugar a avenidas largas e quarteirões regulares, marcando uma mudança radical no modo de vida local.

Como foi o projeto urbanístico de Aarão Reis?

Aarão Reis, engenheiro responsável pela Comissão Construtora da Nova Capital, inspirou-se em modelos de cidades como Paris e Washington. O traçado previa ruas ortogonais cortadas por avenidas diagonais e uma área central bem definida, cercada pela Avenida do Contorno.

Esse planejamento dividia a cidade em três zonas: a urbana, com edifícios públicos e comércio; a suburbana, para expansão futura; e a rural, destinada a colônias agrícolas que abasteceriam a capital. Embora inovador, o projeto não considerou as consequências sociais da remoção de antigos moradores.

Destaques do traçado original
  • Quarteirões de 120 x 120 metros.

  • Avenidas largas, de 20 a 35 metros.

  • Praça da Liberdade como núcleo político.

  • Previsão de cinturão agrícola para abastecimento.

A cidade realmente começou pronta?

Um dado pouco mencionado é que Belo Horizonte foi inaugurada ainda inacabada. Muitas obras estavam em andamento em 1897, e os operários que ajudaram a erguer a cidade não foram retirados após a inauguração, como previa o plano. Sem condições de permanecer no centro, muitos formaram favelas em áreas periféricas.

Esse detalhe mostra que a “cidade planejada” conviveu desde o início com contradições entre ordem e improviso. O contraste entre a malha urbana moderna e a realidade das ocupações populares marcou o desenvolvimento posterior da capital.

Quais personagens ficaram à margem dessa narrativa?

Os registros oficiais destacam engenheiros, políticos e governadores, mas pouco se fala dos trabalhadores que construíram a cidade. Pedreiros, carpinteiros e imigrantes tiveram papel fundamental, assim como as famílias removidas do Curral del-Rei.

Essas vozes pouco aparecem nos manuais, mas permanecem vivas em memórias familiares e estudos acadêmicos. Museus como o Histórico Abílio Barreto resgatam parte dessas histórias, mostrando objetos, documentos e fotografias do período.

Como Belo Horizonte se reinventou após a inauguração?

Nas décadas seguintes, a capital passou por mudanças que também ficam de fora da versão escolar. A industrialização entre os anos 1930 e 1940 trouxe crescimento acelerado, ao mesmo tempo em que surgiram marcos arquitetônicos como o Conjunto da Pampulha, encomendado por Juscelino Kubitschek.

Essas transformações fizeram BH extrapolar rapidamente o planejamento inicial. O limite populacional previsto foi superado em poucas décadas, e a cidade precisou se adaptar a um crescimento desordenado.

Onde ainda é possível ver vestígios dessa história não contada?

Apesar da transformação urbana, alguns locais preservam memórias do período anterior e dos primeiros anos da capital.

Locais de memória em Belo Horizonte
  • Museu Histórico Abílio Barreto – preserva o antigo casarão do Curral del-Rei.

  • Praça da Liberdade – símbolo do poder republicano e hoje centro cultural.

  • Bairros Lagoinha e Santa Tereza – guardam tradições ligadas a antigos moradores e imigrantes.

Esses espaços oferecem uma visão mais completa da formação de Belo Horizonte, revelando aspectos que não aparecem em narrativas simplificadas.

A história recente também é pouco lembrada?

Além do período da fundação, episódios do século XX também são pouco explorados nos livros escolares. A visita do Papa João Paulo II em 1980 à Praça do Papa, por exemplo, marcou a cidade com forte simbolismo religioso. Outro marco foi a degradação da Lagoa da Pampulha, que exigiu esforços posteriores de recuperação ambiental.

Esses momentos mostram como Belo Horizonte continua a escrever sua história de forma dinâmica, enfrentando desafios e se reinventando a cada década.

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Por que olhar para a história não contada de BH?

A história de Belo Horizonte vai muito além da versão resumida apresentada nas salas de aula. Entender o desaparecimento do Curral del-Rei, o impacto social das remoções e as contradições do planejamento urbano é essencial para compreender a capital mineira em sua totalidade.

Conhecer essa dimensão é também valorizar a memória de quem ajudou a construir a cidade, mas não foi registrado nos livros. Ao visitar Belo Horizonte, em Minas Gerais, o viajante tem a chance de redescobrir essas histórias em praças, museus e bairros tradicionais.

Mais do que um roteiro turístico, é um convite a enxergar a capital mineira em profundidade: uma cidade feita de memórias, contradições e reinvenções, que continua a revelar capítulos esquecidos de sua própria trajetória.

Sobre o autor:

Igor Souza é criador do Olhares por Minas, fotógrafo e especialista em turismo mineiro. Viaja por cidades históricas, cachoeiras e vilarejos, buscando contar as histórias que Minas tem a oferecer. Saiba mais sobre o autor clicando aqui.

Vista panoramica da grande Belo Horizonte, vista do mirante da Serra do Curral
Vista panoramica da grande Belo Horizonte, vista do mirante da Serra do Curral

Belo Horizonte/MG - Foto: Igor Souza

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