Um distrito, dois séculos de história e um detalhe que ninguém nunca percebeu no turismo
Conheça o distrito mineiro onde a história caminha junto com o presente e um detalhe surpreendente passa despercebido por muitos turistas
Muitos viajantes passam pela movimentada BR-356, a histórica Rodovia dos Inconfidentes, sem imaginar que estão cruzando o berço da administração de Minas Gerais. Cachoeira do Campo, hoje um tranquilo distrito de Ouro Preto cortado por esta via fundamental, já funcionou como a primeira capital não oficial do estado, um lugar onde decisões cruciais foram tomadas muito antes de Ouro Preto se tornar o centro do poder.
Descubra a história da primeira sede do governo de Minas Gerais.
Visite a imponente Matriz de Nossa Senhora de Nazaré, uma das mais antigas do estado.
Entenda a localização estratégica do distrito na famosa Estrada Real.
Por que este lugar é considerado o "berço" administrativo de Minas?
A história que poucos conhecem é que, no início do século XVIII, antes da fundação oficial de Vila Rica, foi em Cachoeira do Campo que o primeiro governador da Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, Dom Pedro de Almeida e Portugal (Conde de Assumar), fixou residência. O distrito, por sua localização estratégica, tornou-se o centro administrativo e militar da colônia, sendo palco de eventos decisivos, como a Sedição de Vila Rica.
Essa função de "capital" primitiva durou pouco, mas deixou marcas indeléveis. A escolha do local para sediar o poder revela sua importância logística e econômica já naquela época. Conhecer Cachoeira do Campo hoje é, portanto, visitar o ponto de partida da organização política de Minas Gerais, um fato surpreendente que não está na maioria dos guias turísticos.
A Matriz de Nossa Senhora de Nazaré: uma fortaleza da fé e da história
O grande marco arquitetônico do distrito é sua imponente Igreja Matriz. Dedicada a Nossa Senhora de Nazaré, ela é considerada uma das primeiras matrizes de Minas Gerais, com sua construção iniciada ainda nas primeiras décadas do século XVIII. Sua estrutura robusta, com grossas paredes de pedra, confere-lhe uma aparência de fortaleza, um reflexo dos tempos turbulentos em que foi erguida.
Por dentro, a igreja guarda elementos do barroco primitivo e obras de importantes artistas da época. Visitar a Matriz de Nazaré não é apenas um passeio religioso; é um contato direto com a gênese da arte e da arquitetura mineira. Seus altares e sua história a colocam em um patamar de importância similar ao de igrejas muito mais famosas, tornando-a uma parada obrigatória.
Quais histórias as duas igrejas principais do distrito contam sobre a sociedade colonial?
Além da Matriz, outro templo se destaca: a Capela de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. A existência das duas igrejas tão próximas revela muito sobre a rígida estrutura social da época. Enquanto a Matriz de Nazaré era o centro da elite branca, a Capela do Rosário foi erguida pelas irmandades de negros, escravizados e libertos, que ali tinham seu próprio espaço de fé e resistência.
Visitar as duas igrejas em sequência permite uma leitura clara da dinâmica social do Brasil Colônia. De um lado, a opulência e o poder da igreja principal; do outro, a simplicidade e a resiliência da capela da comunidade negra. Essa dualidade é uma aula de história a céu aberto, mostrando como a fé se manifestava em diferentes camadas da sociedade.
Um roteiro a pé pelo centro histórico
Explorar Cachoeira do Campo é fácil e agradável. O núcleo histórico é compacto e pode ser percorrido a pé. O traçado urbano ainda preserva a lógica colonial, onde as ruas principais parecem convergir para a igreja matriz, o centro da vida pública. Um pequeno roteiro pelo distrito deve incluir:
Igreja Matriz de Nossa Senhora de Nazaré: O ponto de partida e principal monumento.
Casario colonial: Observe as fachadas simples e bem preservadas ao redor da praça da matriz.
O que esperar das tradições e festas locais?
Apesar das mudanças ao longo dos séculos, Cachoeira do Campo mantém um forte apego às suas tradições. A cultura local é uma mistura viva de fé, música e encontros comunitários, que se manifesta de forma especial em seu calendário festivo. Quem visita o distrito pode ter a sorte de presenciar eventos que são a pura expressão da alma mineira.
A Festa de Nossa Senhora de Nazaré, padroeira do distrito, celebrada em setembro, é o auge do calendário. Durante o evento, as ruas se enchem de moradores e visitantes para as novenas, missas, procissões e as tradicionais barraquinhas. Além dela, as celebrações da Semana Santa também são muito fortes, mantendo rituais que se repetem há mais de 300 anos.
Cachoeira do Campo na Estrada Real: dicas para o viajante
Hoje, a localização estratégica do distrito ganha um novo significado para os viajantes que percorrem a Estrada Real. Situado no Caminho Novo e cortado pela BR-356, Cachoeira do Campo é uma parada perfeita para quem viaja entre Belo Horizonte e Ouro Preto, oferecendo uma experiência histórica genuína. Para quem está na rota, vale a pena considerar estas dicas:
Ponto de apoio: O distrito tem bons restaurantes de comida mineira, sendo uma ótima parada para o almoço.
Base para ecoturismo: A região no entorno possui cachoeiras e trilhas, tornando o distrito uma base interessante para quem quer unir história e natureza.
Cicloturismo: É um ponto de parada frequente para cicloturistas que seguem o traçado da Estrada Real.
+ Leia também: Essa vila entre Ouro Branco e Congonhas vai te surpreender
Muito Além de um Ponto de Passagem
Cachoeira do Campo é a prova de que as histórias mais fascinantes de Minas Gerais muitas vezes estão escondidas à vista de todos. Este distrito não é apenas um coadjuvante na história de Ouro Preto; ele é o prólogo, o capítulo inicial de uma saga de poder, fé e arte que definiria todo o estado.
Parar no distrito, caminhar por suas ruas e visitar suas igrejas é mais do que um desvio no roteiro; é uma oportunidade de se conectar com as origens mais profundas de Minas. Para o viajante atento, Cachoeira do Campo deixa de ser um ponto de passagem para se tornar um destino em si mesmo, um lugar que recompensa com conhecimento, beleza e autenticidade.
Sobre o autor:
Igor Souza é criador do Olhares por Minas, fotógrafo e especialista em turismo mineiro. Viaja por cidades históricas, cachoeiras e vilarejos, buscando contar as histórias que Minas tem a oferecer. Saiba mais sobre o autor clicando aqui.


Cachoeira do Campo/MG - Foto: Igor Souza