Congonhas revela mistério oculto em meio ao barroco mineiro
Congonhas, em Minas Gerais, vai além das esculturas de Aleijadinho e esconde um mistério surpreendente no coração do barroco. Descubra esse segredo e mergulhe na história oculta da cidade
Muito além das esculturas de Aleijadinho
A apenas 80 quilômetros de Belo Horizonte, Congonhas desponta como um dos destinos mais marcantes do roteiro histórico de Minas Gerais. Conhecida mundialmente pelas esculturas dos doze profetas esculpidas por Aleijadinho, a cidade guarda mais do que a beleza do barroco: ela esconde histórias, tradições e um enigma silencioso que atravessa os séculos e instiga estudiosos até hoje.
Ao caminhar por suas ladeiras de pedra, visitar suas igrejas ricamente ornamentadas ou participar de uma procissão, o visitante sente que Congonhas é mais do que um patrimônio tombado — é um território vivo, onde o passado ainda conversa com o presente.
O mistério por trás dos profetas
Entre 1796 e 1805, o mestre Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, esculpiu as icônicas imagens dos doze profetas do Antigo Testamento em pedra-sabão, posicionando-as no adro do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos. As esculturas impressionam pela expressão, pela força simbólica e pelo talento inquestionável do artista.
Mas existe um detalhe curioso que levanta debates até hoje. Alguns estudiosos acreditam que as iniciais dos nomes dos profetas esculpidos — colocadas na ordem em que estão dispostos no adro — formam um acróstico com o nome “ALEIJADINHO”. Seria essa uma maneira sutil de assinar uma obra monumental, em um período no qual artistas mestiços, escravizados ou marginalizados não recebiam crédito formal?
Ainda que não haja consenso entre os historiadores, o fascínio da hipótese é inegável. E é esse tipo de detalhe — quase invisível aos olhos apressados — que transforma Congonhas em um lugar de descobertas para quem sabe observar.
A fé que moldou a cidade
O surgimento e o crescimento de Congonhas estão diretamente ligados à religiosidade e ao ciclo do ouro no século XVIII. Fundada a partir de uma promessa feita por um português curado de uma grave doença, a cidade cresceu em torno da devoção ao Senhor Bom Jesus de Matosinhos — e transformou essa fé em arte.
O Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, tombado como Patrimônio Mundial pela UNESCO, é o maior símbolo da cidade. O complexo reúne a basílica, o adro com os profetas e seis capelas que compõem a Via Sacra. Essas capelas, construídas em pedra, abrigam grupos escultóricos de madeira esculpidos também por Aleijadinho, retratando com emoção intensa os principais momentos da Paixão de Cristo.
O que mais impressiona, além do talento artístico, é a maneira como tudo se encaixa: as capelas formam uma espécie de caminho ascendente, guiando o visitante por uma experiência espiritual e estética única. Cada passo é uma mistura de silêncio, arte e reflexão.
O barroco que pulsa nas ruas
Mesmo sendo reconhecida internacionalmente, Congonhas preserva seu clima de cidade pequena e acolhedora. A vida cotidiana se entrelaça com os elementos barrocos: o som dos sinos ainda marca o ritmo do dia, as festas religiosas seguem firmes, e os moradores caminham pelas mesmas ruas de pedra que viram os passos de escultores, artesãos e romeiros.
Além do santuário, a cidade possui outros templos e capelas de valor artístico e histórico, como a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição e a Igreja de São José Operário. Neles, encontra-se o mesmo cuidado com a ornamentação, os detalhes entalhados em madeira, os altares dourados e o uso da arte como expressão de fé.
Museus e cultura contemporânea
Quem visita Congonhas não encontra apenas um retrato do passado. A cidade também dialoga com o presente por meio de iniciativas como o Museu de Congonhas, um espaço interativo e moderno que apresenta as peças originais das capelas da Via Sacra e oferece uma imersão sensorial na vida e obra de Aleijadinho.
Além do acervo permanente, o museu promove exposições temporárias de arte contemporânea, mostras educativas e ações culturais com foco na valorização da memória e da criação artística atual. Essa união entre passado e presente reforça o papel da cidade como polo cultural dinâmico.
A festa que move multidões: o Jubileu do Senhor Bom Jesus
Todos os anos, entre agosto e setembro, Congonhas vive seu momento mais intenso: a Festa do Jubileu do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, uma das maiores expressões de fé popular de Minas Gerais. Com mais de dois séculos de história, a celebração reúne milhares de pessoas de várias partes do estado e do Brasil.
Durante cerca de dez dias, a cidade se transforma. Romarias percorrem quilômetros a pé até o santuário. Missas campais são celebradas dia e noite. Barracas tomam as praças. O comércio local aquece. Mas, acima de tudo, a fé se manifesta em cada olhar, em cada promessa, em cada gesto de gratidão.
É nessa época que Congonhas mostra com mais força sua alma coletiva e espiritual. A cidade canta, reza, dança e acolhe. E transforma a experiência do visitante em algo que vai muito além do turismo religioso: um encontro com o sagrado.
Sabores que confortam e conectam
Como toda boa cidade mineira, Congonhas conquista também pelo estômago. A culinária local preserva receitas tradicionais, servidas com fartura e acolhimento em restaurantes familiares e lanchonetes espalhadas pelo centro.
Pratos como feijão tropeiro, frango com quiabo, costelinha com angu, torresmo e arroz com pequi fazem parte do cardápio afetivo dos moradores — e encantam os visitantes. Além disso, os doces caseiros chamam a atenção: goiabada cascão, doce de leite, ambrosia e compotas são facilmente encontrados nas lojinhas e feiras locais.
Comer em Congonhas é mais do que matar a fome. É vivenciar o sabor da tradição, preparado com calma, com ingredientes frescos e, sobretudo, com afeto.
Caminhadas entre o passado e o presente
O melhor modo de conhecer Congonhas é caminhando. A pé, é possível se perder (e se encontrar) nas ruelas que ligam o centro histórico ao alto do santuário. No caminho, o visitante encontra ateliês de arte sacra, pequenos museus, lojas de artesanato e cafés com vista para a cidade.
A cidade é relativamente compacta, o que permite explorar as principais atrações com calma. Para quem quer ampliar a experiência, vale a pena conversar com os moradores — muitos deles têm histórias ricas para contar sobre festas antigas, milagres atribuídos ao Bom Jesus ou curiosidades sobre as obras de Aleijadinho.
Uma cidade que surpreende a cada visita
Mesmo quem já visitou Congonhas costuma dizer: sempre há algo novo a descobrir. Um ângulo diferente das esculturas, um detalhe na fachada de uma igreja, uma conversa inesperada com um artesão, uma missa emocionante, um café com broa que aquece a tarde. Congonhas não se esgota — ela revela camadas.
E é esse misto de grandiosidade artística com simplicidade cotidiana que encanta. É uma cidade que se orgulha de seu passado, mas que se move no presente com dignidade, beleza e propósito.
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Descubra o segredo que o barroco mineiro guardou por séculos
Em Congonhas, cada escultura, cada procissão e cada pedra do caminho contam uma parte da história. Mas é no conjunto dessas experiências que o verdadeiro mistério acontece: o de tocar o visitante de forma profunda e inesquecível.
Se você gosta de destinos que provocam, que emocionam e que despertam a curiosidade, Congonhas é para você. Não apenas por causa dos profetas — mas por tudo aquilo que ainda não foi totalmente revelado.
Sobre o autor:
Igor Souza é criador do Olhares por Minas, fotógrafo e especialista em turismo mineiro. Viaja por cidades históricas, cachoeiras e vilarejos, buscando contar as histórias que Minas tem a oferecer. Saiba mais sobre o autor clicando aqui.


Congonhas/MG - Foto: Igor Souza